Kemilly, de 3 anos, passa por tratamento com laserterapia de 15 em 15 dias. Viagem de ônibus para sessão leva 25h; 'Fomos obrigados a mudar', diz pai.
A família da menina Kemilly Vitória Pereira de Souza, 3 anos, que nasceu com o corpo coberto de pelos, se prepara para mudar de vez para Goiânia, onde ela passa por tratamento. De acordo com o pai da criança, o eletricista Antônio de Souza, 34, eles não tiveram outra alternativa a não ser deixar a cidade de Augustinópolis, no Tocantins. “Infelizmente, a viagem até o hospital em Goiânia é muito longa. Apesar do sacrifício de deixar minha casa e demais familiares, vale tudo pelo bem da Kemilly”, disse.
Antônio, que trabalhava em uma indústria na cidade natal, pediu demissão para concretizar a mudança. “Ontem terça-feira eu estive lá para acertar as contas. Trabalhei por mais de sete anos na companhia e não iria sair, se não fosse realmente necessário. Agora estou em busca de oportunidades de trabalho em Goiânia, para que consiga manter a minha família”, destacou.
Kemilly foi diagnosticada com uma doença genética e hereditária chamada "hipertricose lanuginosa", também conhecida como "síndrome do lobisomem", que a faz ter uma quantidade de pelos no corpo acima do normal. Após dois anos buscando tratamento, os pais conseguiram a laserterapia para a filha no Hospital Materno Infantil (HMI), em Goiânia. Ela passa por sessões de 15 em 15 dias e já teve cerca de 80% dos pelos corporais removidos.
O eletricista diz que tentou inúmeras vezes conseguir com a Secretaria de Saúde do Tocantins (Sesau) passagens de avião para o tratamento, mas que todos os pedidos foram negados. A pasta ajudava a família nas passagens de ônibus, mas o trajeto leva mais de 25 horas. “Eles sempre recusam os laudos, alegam que o médico não especificou direito a necessidade do transporte aéreo. Mas eles estão cansados de saber que ela fica com a pele sensível após o tratamento e a viagem longa é muito traumática. Mesmo assim, não se importam”, desabafou.
A Sesau informou que os relatórios assinados pelo cirurgião Zacharias Calil, responsável pelo tratamento da Kemilly, não atendem aos padrões exigidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para o transporte aéreo. Por isso, foi disponibilizado apenas o transporte terrestre.
Já o médico afirma que seguiu todas as recomendações da secretaria para justificar o pedido. “Como médico, já deixei claro que o transporte aéreo vai dar mais conforto para a criança, que fará um tratamento longo, de pelo menos dois anos. Toda vez eles pedem outro documento e assim vai. Até por isso já estou recusando atender pacientes daquele estado, pois a burocracia é sempre grande”, diz.
Ele ressalta que, como a pele da menina fica sensível após a laserterapia, ela não pode ficar exposta ao sol. “Como é que vão protegê-la viajando 25 horas em um ônibus? Por isso, sinceramente, até acho justo que os pais mudem para Goiânia, pois aqui terão um auxílio maior”,
Doações
Sem conseguir a ajuda no Tocantins, Antônio afirma que teve que optar pela mudança. “Muita gente nos auxiliou nesse tempo doando as passagens de avião e com hospedagem. Mas o tratamento da Kemilly será longo, então não dá para permanecer nesse vaivém. Aí conversei com a minha mulher e decidimos que mudar seria a melhor solução.”
Segundo ele, a esposa, a dona de casa Patrícia Batista Pereira, 22 anos, está triste em deixar a casa em que vive, mas sabe que o tratamento da menina é prioridade. “Demoramos muito para conseguir essa ajuda, que está mudando a vida da nossa filha e não vamos parar. Ela Patrícia tem medo de que a Kemilly sofra com a falta dos primos e tias, que estão sempre por perto. Por isso, sabemos do sacrifício, mas vai dar tudo certo”, ressaltou o eletricista.
A família vai morar em uma casa no Setor Balneário Meia Ponte, em Goiânia, onde pagará R$ 450 de aluguel. No mesmo quintal moram outras três famílias.
A mudança ainda não tem data definida, pois a família ainda organiza os pertences pessoais e está à procura de uma transportadora que leve os móveis de Augustinópolis à Goiânia. “Apesar do aperto no peito, estou confiante que tomamos a melhor decisão. Agora é só trabalhar e seguir a vida”, concluiu Antônio.
Tratamento
Kemilly já passou por seis sessões de laserterapia desde o início do tratamento, em dezembro do ano passado. A previsão é de que sejam realizadas, ao todo, 40 sessões em um período de dois anos. A cada nova etapa, também é necessário que se façam retoques nas áreas já tratadas.
A criança completou três anos de idade no último dia 21 e comemora a nova aparência. "Ela está toda convencida, se arruma em frente ao espelho e fica se olhando, passando a mão no rosto, já sem os pelos", contou a mãe. "O maior presente é a felicidade dela", completou Patrícia, emocionada.
Para Zacharias Calil, o tratamento apresenta resultados satisfatórios. "Nós estamos bem felizes por ela. Ela está reagindo muito bem, mudou completamente. Ela já percebe toda a diferença no corpo", destacou o médico.
Em função da mudança de cidade, a data do novo procedimento ainda não foi marcada pelo HMI.