Kátia Abreu foi autora do requerimento para a sessão especial.
O Senado realizou nesta quinta-feira (14) sessão de homenagem ao trabalho do jornalista Otávio Frias Filho (1957-2018), e à história do jornal Folha de S.Paulo, que completa 98 anos. O requerimento para a realização da audiência foi da senadora Kátia Abreu (PDT-TO). Senadores e convidados comentaram a postura da Folha ao longo das últimas décadas e nos dias atuais.
Ao falar sobre Otávio Frias Filho, a senadora Kátia Abreu lembrou que o jornalista comandou, por décadas, o maior jornal do país, sem perder de vista o contraditório, a pluralidade e a diversidade de vozes.
“Fiquei honrada e feliz quando o convidei e ele aceitou visitar o Tocantins. Além de Palmas e Formoso do Araguaia, um grande polo de produção de grãos, estivemos também no Jalapão. O excepcional jornalista crítico, apartidário e pluralista que deixou o jornalismo muito melhor – e muito maior – do que encontrou estava ali, ao lado dos artesãos e das artesãs do meu Estado, no Jalapão, conversando sobre a realidade do nosso Brasil profundo. Apreciou os pontos turísticos de uma beleza esplendorosa no Jalapão: tomou banho no fervedouro, caminhou pelas dunas alaranjadas e se emocionou com a força da Cachoeira da Velha. Se ele estivesse na sede da Folha de S.Paulo ou no interior do Tocantins, era a mesma pessoa: sinônimo de simplicidade e de correção.”
A parlamentar também defendeu a liberdade de imprensa. Kátia disse que a democracia passa por um momento delicado, com constantes ataques a imprensa, e criticou qualquer tipo de censura à liberdade de expressão.
"Nada é mais importante do que isso. Eu não conheço nenhuma democracia no mundo onde a imprensa seja amordaçada, calada, destruída, criticada, abusada. Contestar, sim! Esse é um direito que todos nós temos se nos sentirmos injustiçados" disse.
Na mesma linha, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) frisou que nunca a sociedade brasileira consumiu tanta informação ao mesmo tempo, e que isso facilitar a propagação de fake news, que devem ser combatidas. Entretanto, não há espaço para calar a informação.
“Da nossa perspectiva, temos que reiterar uma firme posição em defesa da democracia e seu mais importante reflexo, a liberdade de expressão, interditando qualquer ensaio na tentativa de controlar o livre debate no País. O modelo democrático brasileiro, a exemplo das nações modernas, se opõe ao pensamento único e monocrático, inservível à própria democracia.”
Representante do Supremo Tribunal Federal (STF) na sessão, o ministro Gilmar Mendes reconheceu o trabalho do jornal e de Frias.
— Nem sempre gostei do que a Folha publicou sobre o meu desempenho, discordei da opinião do jornal muitas vezes, mas sempre considerei que a imprensa livre não existe para agradar a este ou aquele, tampouco a mim. E sempre reconheci no jornal e naquele que o comandou com brilho e talento, a honestidade de propósito. O grande valor da democracia está nas divergências — disse o ministro.
Autocrítica
Os senadores lembraram a instalação do Projeto Folha, que em 1984 abriu uma nova proposta de jornalismo “crítico, apartidário, pluralista e moderno”, nas palavras do senador Antônio Anastasia (PSDB-MG).
Integrando a Mesa durante a sessão de homenagem, a atual diretora de Redação do jornal, Maria Cristina Frias, detalhou essa linha editorial:
— A ideia central do jornalismo que praticamos é que os poderes numa sociedade democrática precisam ser contrastados, não podem ser exercidos sem crítica ou contrapeso, sob o risco de se desviarem para o arbítrio.
De acordo com ela, o jornalismo não pode ser exercido “num vácuo de autocritica e controle internos”. Maria Cristina Frias destacou que, mesmo quando o jornalismo é praticado sob estritos protocolos técnicos, a capacidade de enxergar todo o campo é limitada — até pela natureza apressada do ofício — e incompleta do objeto.
— É um fiapo de história que ainda não se revelou por inteiro — descreveu.
Maria Cristina Frias reconheceu que o jornalismo está sujeito a cometer erros e impropriedades. Uma maneira de reduzir esse risco, observou, é instalar mecanismos de autocontrole.
— A Folha tem como rotina inarredável ouvir os argumentos de quem foi criticado nas matérias. Cultiva a pluralidade no seu quadro de jornalistas, colunistas e articulistas. O intuito é permitir o florescimento de um jornalismo crítico e preciso e leal com leitores, fontes e personagens da notícia.
O presidente da ANJ, representando todos os jornais do Brasil, reforçou que livre exercício do jornalismo é fundamental para a sociedade e é inseparável da democracia.
“A Folha segue com brilho a direção apontada por Otavio, agora com a Maria Cristina na difícil tarefa de substituí-lo. A ANJ cumprimenta Maria Cristina e todos aqueles que fazem, a cada dia, a cada minuto, a Folha de S.Paulo. Que vocês prossigam com sua missão, assim como todos os que fazem jornalismo profissional, independente e de qualidade em nosso País. Repito: precisamos de mais e mais jornalismo, precisamos de mais e mais liberdade de imprensa”, falou.
Otávio Frias Filho
A sessão de homenagem aos 98 anos do jornal também foi um reconhecimento ao trabalho de Otávio Frias Filho na condução do jornal desde 1984 até o ano passado, quando morreu, aos 61 anos, vítima de um câncer.
Frias foi idealizador do código de ética da Associação Nacional de Jornais, que contém os princípios da auto-regulamentação dos periódicos brasileiros, trazendo ideias de independência, busca da verdade, profissionalismo, compromisso com os valores da democracia, reconhecimento e correção de erros.